PROJETO NEGROS E NEGRAS EM MOVIMENTO

Objetivos: - A contribuição do negro na formação social brasileira - A discriminação racial no Brasil. Movimentos de resistência de negros pela cidadania e pela vida; - Políticas sociais e população negra: trabalho, saúde, educação e moradia; - Relações étnico-raciais, multiculturalismo e currículo; - Aspectos normativos da educação de afro-brasileiros. - EMAIL PARA CONTATO: negrosenegras@gmail.com

December 16, 2008

2008, o ano de grandes reflexões para a população negra

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Por Maria Bernadete L. da Silva
Diretora de Proteção ao Patrimônio Afro-brasileiro da Fundação Cultural Palmares



"(...) a condição inicialmente escrava dos primeiros (negros) e as conseqüências sócio-históricas a ela vinculadas contribuíram para acentuar a diferença que fundamenta a discriminação, mas o complexo processo de miscigenação aqui efetivado teceu o véu que pretende disfarçar o preconceito e que precisa ser permanentemente denunciado(...)
(Proença Filho, 1975)



Nesses 120 anos de abolição da escravatura, desejamos celebrar a liberdade conquistada pelos nossos antepassados, deixada a nós como herança. Celebramos, ainda, a dignidade e a coragem para continuar lutando por uma vida com cidadania plena. Segundo os dados do Atlas Racial Brasileiro, divulgados pelo PNUD, em 2004, 65% dos pobres e 70% dos indigentes brasileiros são negros. A pesquisa mostra ainda que, apesar de uma queda nos números de mortalidade infantil, as taxas entre os filhos de mulheres negras são 66% acima das registradas entre os de mulheres brancas. É inegável que a pobreza e a exclusão neste país que se orgulha de proclamar sua igualdade racial e a democracia multiétnica têm cor e raça. Somos nós, os negros e todos os afro-descendentes desse enorme país, que ainda nos constituímos na grande maioria oprimida, excluída e marginalizada.

A escravidão acabou. Faz 120 anos que foi assinada a Lei Áurea, mas as seqüelas das mentalidades senhoriais e escravistas em nossa sociedade ainda estão vivas, continuam pulsantes e adquiriram novos matizes e tonalidades. Da sujeição degradante de seres humanos, embarcados em navios negreiros sob correntes embarcados a ferro em brasa para a produção de riquezas que nunca lhes trouxeram prosperidade, aos indicadores sociais e econômicos atuais, podemos perceber uma sociedade insistentemente opressora e escravocrata, na qual os negros e sua descendência ainda são considerados cidadãos de segunda categoria e sujeitados a práticas indignas e aviltantes.

A escravidão foi a força nefasta que nutriu com o sangue dos africanos e de seus descendentes, na América em geral e no Brasil em específico, a economia senhorial por mais de 300 anos. Não existe explicação plausível que seja capaz de atenuar ou justificar a ignomínia da escravidão mercantilista, direcionada contra a população africana pelos europeus que colonizaram a América e o Brasil. O processo histórico conhecido como escravidão negra não encontra precedentes que possam explicar de forma convincente a total ausência de decência e dignidade dos cristãos e muçulmanos diante das populações negras escravizadas e vendidas para a América, para a Ásia e outras regiões. Nada há que se compare a essa tragédia em sua intensidade e duração.

Força e determinação - Mesmo assim, não se pode perder de vista a força e a determinação das populações negras transplantadas, à força para as pátrias da escravidão no Novo Mundo. É a sua força e o seu sangue que construíram essas terras e suas sociedades, sua riqueza, sua gente e suas culturas e valores. Como povo, somos muito mais negros do que atestam as cores de nossos corpos nas Américas. A enorme herança deixada pelos escravizados e seus descendentes se traduz em todas as expressões dos cotidianos de nossos povos, países e costumes, economias e culturas.

A força e a violência da escravidão não ocultam a grandeza dos homens e mulheres a ela submetidos e que contra ela se insurgiram em todos os momentos, evidenciando claramente que nunca se tratou de um "contrato" como postularam muitos historiadores, mas sim de uma violência contra a humanidade e numa deformação daquilo que os escravizadores chamaram de civilização. A história da escravidão africana pode e deve ser lida a partir da ótica da resistência dos escravizados. Essa resistência deu-se sob todas as formas e em todos os momentos e ainda hoje se expressa nas lutas dos afro-descendentes em busca da verdadeira democracia racial e da igualdade cidadã que embora seja tão louvada em nosso país, nunca foi realmente aplicada.

Africanos e seus descendentes no Brasil resistiram á dominação escravista de todas as formas possíveis, desde a composição de um universo social paralelo a dos brancos, magnificamente tecido nos contextos das religiões de matrizes africanas que deram aos escravizados novos horizontes e a possibilidade de se redignificarem adquirindo posições sociais, famílias e honras, até as fugas e a constituição de sociedades e de estados paralelos aos dos brancos, expressos pelos quilombos que colocaram o sistema escravista, permanentemente, em estado de alerta e de defesa. A escravização não foi aceita de forma passiva e mesmo supostos atos de submissão por parte dos escravos podem ser percebidos sob a ótica da resistência e da luta pela liberdade.

Novo confinamento - Sabemos que a abolição foi inconclusa, jamais foi completada, e tanto o Estado Nacional do Brasil, quanto a sua sociedade, jamais elaboraram qualquer projeto que tivesse por objetivo minimizar os males de mais de três séculos de escravidão infamante. Os procedimentos da abolição, levados a cabo quando em toda a América já se tinha consumado o fato, só vieram a se completar no Brasil, quando as pressões externas se tornaram insuportáveis e a economia escravista já não representava uma fonte de ganhos confiáveis, uma vez que o tráfico estava inviabilizado e os boicotes impostos por países, como a Inglaterra, impunham a adoção do trabalho livre. Entretanto, essa libertação trouxe poucas alterações para as populações negras do país. A libertação das senzalas significou um novo confinamento, dessa vez nas favelas, onde ainda hoje os negros morrem indistintamente, acusados de forma banal de liderarem o tráfico de drogas ou simplesmente alvos de balas perdidas, vítimas sociais de uma violência que pouca atenção recebe por parte dos poderes constituídos.

Durante décadas, após a abolição, as populações negras foram exploradas e aviltadas sob as mais diversas circunstâncias. Muito desse processo ainda não está devidamente estudado e podemos observar uma enorme lacuna nos estados sobre os cotidianos das populações negras urbanas e rurais do Brasil no período compreendido entre os anos 1890 a 1940. Meio século após a abolição, populações negras experimentavam o horror das perseguições policiais e religiosas, a intolerância social e a difamação cientifica ao expressarem suas crenças e convicções religiosas herdadas de seus ancestrais. Nesse mesmo período, observamos a favelização de enormes contingentes de populações negras, excluídas dos benefícios das revoluções sanitárias e urbanas por que passou o país na primeira metade do século 20. O que dizer então do acesso à terra e da legalização das posses e propriedades fundiárias das populações e comunidades de negros por parte do Estado Nacional? Basta nos lembrarmos de que a questão e o tema dos quilombos estiveram absolutamente ausentes de toda e qualquer discussão política no país desde a abolição até a promulgação da Constituição de 1988.

Em diversos momentos o Estado Nacional expressou sua vergonha pela presença maciça de negros em sua sociedade, esquecendo-se de que foram os negros e seus descendentes que construíram a grandeza e a civilização desse país.

Estatuto da Igualdade Racial - Em função de uma luta histórica, em que se percebe claramente o ativo papel das populações negras na busca por uma sociedade mais justa e democrática, o senador Paulo Paim, um representante negro, no legislativo que muito nos honra e dignifica, decidiu, neste ano de 2008, conclamar a sociedade para refletir sobre os 120 anos passados desde a assinatura da Lei Áurea e colaborar para que os projetos que possam pavimentar a via da igualdade etno-racial em nosso país e que se encontram em tramitação no Congresso Nacional possam ser aprovados, a exemplo do Estatuto da Igualdade Racial, que tramita no Congresso marcado pr uma clara ideologia branqueadora há dez intermináveis anos.

Ao examinarmos esses 120 anos passados desde a abolição da escravidão no Brasil, lançamos um olhar para o futuro, respeitando e honrando a luta dos homens e mulheres que aqui estiveram antes de nós e abriram caminhos, lutaram por ideais de igualdade e de justiça, enfrentaram o ódio, as perseguições e os preconceitos, viveram e morreram para que nós que aqui continuamos a jornada possamos ampliar e pavimentar os caminhos por eles traçados e abertos com suas lutas e seu sangue, a fim de que aqueles que nos sucederão nessa jornada interminável que é a vida possam encontrar dignidade, onde hoje ainda impera a injustiça e as desigualdades.

Mesmo sabendo que ainda há um longo caminho a percorrer, para garantir uma educação pública de boa qualidade, para que não tenhamos, mais adiante, que continuar a defender as cotas para a educação superior que poderão representar a diferença entre a inclusão ou a continuidade da exclusão, sabemos que a luta é boa e como tal deve ser encarada. Esse ideal de luta deve estar vivo em cada um de nós para garantir aos nossos irmãos o acesso e a permanência na terra conquistada e mantida por seus ancestrais ou, ainda, a dignidade de empregos bem remunerados e a garantia da boa formação de nossa mão-de-obra, aproveitada em trabalhos dignos e rentáveis, capazes de tirar nossos irmãos da miséria e da vergonha da pobreza humilhante. Só assim a abolição será uma realidade.

Este 2008 é realmente de grandes temas: 120 anos da abolição, 100 anos de nascimento de Solano Trindade; 100 anos de Umbanda, 40 anos do assassinato de Martin Luther King, 25 anos dos agentes pastorais negros, e 20 anos da publicação do artigo 68 da Constituição Federal. Que seja o ano em que o Estado Nacional e a sociedade brasileira possam, enfim, definir bases que viabilizem a inclusão dos afro-descendentes nos contextos das políticas públicas e que as reivindicações mais justas de acesso à terra por parte das populações de remanescentes dos quilombos, a garantia de igualdade de condições de acesso aos benefícios cidadãos e o respeito integral aos direitos individuais e coletivos das populações negras e seus descendentes sejam realmente assegurados.

Solano Trindade - Quero aqui abrir um parêntese e falar de um personagem singular no contexto das personalidades negras de nossa cultura nacional. Trata-se do ator, poeta e pintor Solano Trindade, que nasceu em Recife, em 1908. Era filho do sapateiro Manuel Abílio e da quituteira Merença (Emerenciana). A poética e o intenso labor artístico de Solano Trindade estão muito além do que se convencionou classificar, de forma pejorativa na maioria das vezes, de uma estética-poética "negra" ou "folclórica". O seu método era sintetizado na frase: "Pesquisar na fonte de origem e devolver ao povo em forma de arte". Ou seja, o papel do artista é o de defrontar o povo com aquilo que ele mesmo produz para que ele (o povo) se veja como sujeito criador de cultura e sentido para o mundo. Dessa maneira, o artista cumpre o seu papel criativo de intérprete/desconstrutor da realidade e, ao mesmo tempo, se liga historicamente às aspirações e dilemas dos homens e mulheres do povo.

Para Solano, a cultura negra traduz valores universais que, sem diluir-se no amálgama cultural brasileiro, refaz-se historicamente em forma de consciência crítica e transformadora da realidade social. Em resumo: escutar o povo e traduzir a sua consciência em forma de poesia. Neste trecho do poema "Conversa" (Cantares a Meu Povo, 1963) o poeta coloca-se como um crítico à realidade dos negros sem, com isso, se arrogar o papel de "observador neutro" ou de "eleito" que fala assepticamente para "os de baixo", pois conhece a "verdade". Ao contrário, Solano, ao identificar-se com os dramas do negro, o faz como um negro, como parte, e é dessa posição que lança o seu olhar crítico, em forma de poesia, às condições degradantes de trabalho e de vida do povo. Por isso, o poema é estruturado na forma de um diálogo e é por meio desse instrumento que se desmistifica a realidade presente, poesia nos faz sentir saudade, lamento, dor, paixão... ou realidade... Eita negro! Quem foi que disse que a gente não é gente? Quem foi esse demente, se tem olhos não vê... "Que foi que fizeste mano pra tanto falar assim".


Plantei os canaviais do Nordeste


E tu, mano, o que fizeste? Eu plantei algodão nos campos do sul
pros homens de sangue azul que pagavam o meu trabalho
com surra de cipó-pau.
Basta, mano, pra eu não chorar,
E tu, Ana, Conta-me tua vida,
Na senzala, no terreiro - Eu...cantei embolada,
pra sinhá dormir, fiz tranças nela,
pra sinhá sair ...



100 anos de Umbanda - Desejo também celebrar os 100 anos da Umbanda, a religião nacional, por excelência, síntese de tudo o que somos e de tudo aquilo em que cremos. Imagem clara e dinâmica de nossa cultura e de nossa sociedade, sempre em movimento, jamais acomodada, sempre aberta ao novo e às mudanças. Religião de matriz africana muito importante desempenhou um papel fundamental na resistência contra o preconceito e a perseguição, durante o Estado Novo e continua desempenhando contra a intolerância nos dias de hoje, foi fundada em 15/11/1908 no Estado do Rio de Janeiro. Enraizada na cultura brasileira, evoluiu muito durante esses cem anos de existência. Os rituais que antes aconteciam apenas de forma escondida pela perseguição que sofriam, hoje contam com grandes instituições e colégios que a fortalecem, até mesmo com uma Faculdade de Teologia Umbandista reconhecida pelo MEC. Presente atualmente em 12 países, a Umbanda possui milhares de adeptos em todo o mundo, principalmente no Brasil, onde surgiu.

Infelizmente o preconceito e a intolerância religiosa enfrentada por essas comunidades ainda é muito grande, o que faz com que esses números tão expressivos não sejam observados facilmente nas ruas. A grande maioria desses templos de Umbanda, cerca de 90%, não possui identificação em suas fachadas, e a grande maioria dos umbandistas, quando questionada sobre sua religião, não se identifica como tais. Tudo isso pelo temor à animosidade da sociedade, que de uma forma geral critica aquilo que desconhece. Esses dois procedimentos, tanto da sociedade umbandista como da não-umbandista, causam um ciclo vicioso, gerando assim mais preconceito e mais temor ao preconceito, conseqüentemente causando a exclusão social de uma grande parcela da comunidade.

Luther King - Homenageio também o grande líder e humanista Martin Luther King, cuja morte ocorreu há 40 anos, vítima de um assassinato que expressou todo o conteúdo da intolerância racial da civilização norte-americana. Ativista defensor dos direitos civis, nos Estados Unidos, morreu sem realizar o sonho de ver uma nação lá, ou aqui, onde as pessoas fossem julgadas pelo seu caráter e não pela cor de sua pele.

O ano de 2008 marca, também, os 25 anos dos agentes pastorais negros. O surgimento dos Agentes de Pastoral Negros (APNs) está relacionado a uma série de fatores que determinaram a sociedade brasileira e as igrejas na década de 1970 e no início da década de 1980, dentre eles: o fim da ditadura militar, a luta pela democracia, o fortalecimento da Teologia da Libertação etc. Os Agentes de Pastoral Negros pautam a sua ação na conscientização, na organização e na valorização da população afro-brasileira. Assim, um dos indicativos para os APNs foi a organização de trabalhos e ações junto às comunidades afro-brasileiras empobrecidas, o diálogo com as comunidades de matriz africana e com o movimento social e popular. A atuação dos APNs na defesa dos direitos e na promoção da comunidade negra constitui-se, desde o princípio, como uma ação conscientizadora e libertadora. Nesse contexto, a prática de fé constitui-se um dos elementos fundantes para a luta contra o racismo e a discriminação na sociedade e nas igrejas. Ao longo desses 25 anos dos APNs, não podemos deixar de considerar o que aconteceu ao longo desse processo no mundo, na sociedade brasileira e no movimento social, particularmente no movimento negro.
Considero que os agentes pastorais negros vêm ocupar o espaço deixado pelas antigas irmandades negras, de tão grande importância, durante o período da escravatura e no pós-abolição.
Divisor de águas - Neste ano ainda comemoramos os 20 anos do art 68 da Constituição Federal, seguramente umas das maiores conquistas sócias de nossa sociedade e, sem dúvida alguma, o grande divisor de águas na luta pelo acesso á terra de uma enorme parcela da população rural brasileira, constituída por negros afro-descendentes remanescentes dos quilombos.

No final da década de 1980, o Brasil viveu um momento especial. sob forte pressão, os parlamentares aprovaram uma nova Constituição para a nação brasileira. A nova Carta Magna trouxe uma novidade que modificou, parcialmente, a história de uma parcela do campesinato brasileiro. No art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias foi inserido um direito especial: ?Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos? (TRECCANI, 2006: 83).

Racismo ambiental - Uma questão que tem alterado o ritmo de vida das populações negras e indígenas em todo o Brasil refere-se a uma nova especificidade do racismo, denominado, então como "racismo ambiental". Tal prática é uma flagrante evidência da hierarquização social estruturada a partir dos valores econômicos e políticos e das relações sócio-ambientais que se pautam a partir dessas hierarquizações que ignoram o verdadeiro valor de sociedades e populações e, em muitos casos, a humanidade de grupos sociais, que se tornam conjuntos indesejáveis diante de questões que apresentam um caráter ambiental que, pretensamente, seria de interesse de uma parcela mais relevante da sociedade.

Para que nosso pensamento possa ser melhor esclarecido, torna-se necessário, a princípio, conceituar o termo "racismo ambiental": "Pode-se definir como sendo a colocação intencional de lixeiras perigosas, aterros sanitários, incineradoras, indústrias poluidoras etc., em comunidades habitadas por minorias étnicas ou pelas camadas mais desfavorecidas economicamente da população. Essas comunidades são particularmente vulneráveis porque são vistas como não reivindicativas, sem poder de negociação e fracas politicamente devido à sua enorme dependência dos empregos e ao medo pela própria sobrevivência econômica".

Cotas para afro-descendentes - Depois de longa luta dos movimentos negros, as cotas estão em vigor, apesar da resistência de alguns, e para provar o contrário do discurso desses, está provado que o desempenho dos cotistas é de muito boa qualidade. Os quilombolas conseguiram garantir uma consulta pública respeitando a convenção 169 da OIT (organização Internacional do Trabalho), pela primeira vez na história do pais, para deliberar sobre a regulamentação fundiária dos seus territórios.

Talvez, o objeto de nossa luta: uma sociedade livre de preconceitos e de qualquer tipo de discriminação, onde haja oportunidades iguais, onde cada homem e mulher negra possa exercer cidadania plena ainda esteja longe de ser concretizada, mas já provamos que somos persistentes, que somos capazes de conviver e de mudar as adversidades. Não escolhemos, enquanto povo, vir para os campos e as lavouras do Brasil como escravizados. Nossos ancestrais foram seqüestrados e violentamente trazidos para esta terra. Gerações de negros africanos e seus descendentes aqui viveram e morreram, forjando uma identidade pluriétnica para esta Pátria que não é branca.

Somos todos brasileiros, independente da cor e da origem e a Constituição garante a todos os cidadãos a igualdade de direitos e de benefícios por parte do Estado. Nossa luta é para garantir essa igualdade, para fazer valer a Constituição e em respeito ao sofrimento e à determinação de todos aqueles que nos precederam nessa longa jornada que começou na escravidão de homens e mulheres que se mantiveram livres em seus espíritos ousados e insubmissos.

Não comemoramos hoje a mera assinatura de um documento tardio que legalizava uma situação que por si mesma se mostrava insustentável e vergonhosa para o próprio país. Após 120 anos da Lei Áurea, temos o que comemorar sim: nossa luta, nossa insatisfação com as desigualdades persistentes, nosso desejo de mudanças, de justiça e de reparação, nossa vontade de sermos brasileiros por completo, cidadãos plenos e dignos em uma sociedade sem racismo e sem distinções de raça, cor, gênero, credo, ou qualquer outro tipo de auto-definição.



Referências:

CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.

MATTOS, Hebe Maria. Das cores do silêncio. Os significados da liberdade no sudeste escravista. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1998.

SANTOS, Ivair Augusto dos. O Movimento Negro e o Estado (1983-1987). São Paulo, Imprensa Oficial, S/D.

GUIMARÃES, Antônio Sérgio Alfredo e HUNTLEY, Lynn. Tirando a máscara. Ensaios sobre o racismo no Brasil. São Paulo, Paz e Terra, 2000.

CHIAVENATO, Julio J. O negro no Brasil. Da senzala à Guerra do Paraguai. São Paulo, Brasiliense, 1987.

SILVA, Nelson F. I. da. Consciência negra em cartaz. Brasília, UNB. 2001.

BARBOSA, Lúcia Maria de A., SILVA, Petronilha B. G. , SILVÉRIO, Valter r. (orgs). De preto a afro-descendente. Trajetos de pesquisa sobre relações étnico-raciais no Brasil. São Carlos, EDUFSCAR, 2004.

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