PROJETO NEGROS E NEGRAS EM MOVIMENTO

Objetivos: - A contribuição do negro na formação social brasileira - A discriminação racial no Brasil. Movimentos de resistência de negros pela cidadania e pela vida; - Políticas sociais e população negra: trabalho, saúde, educação e moradia; - Relações étnico-raciais, multiculturalismo e currículo; - Aspectos normativos da educação de afro-brasileiros. - EMAIL PARA CONTATO: negrosenegras@gmail.com

July 02, 2007

Quilombos: memórias e resistência

(*) Edmilson Santos

Nos últimos tempos, a mídia tem dado grande destaque às comunidades remanescentes de quilombo de todo o país. Porém, esse enfoque, em sua essência, é feito de forma maniqueísta e equivocada. Presos a uma concepção de quilombo há muito rejeitada pela historiografia - pesquisadores sérios e reconhecidos por sua competência, como Flávio dos Santos Gomes e Pedro Paulo Funari, em seus trabalhos, colaboram para a desconstrução dos frágeis argumentos que baseiam a perspectiva de quilombo como um lugar sem contatos com o mundo exterior, sem trocas culturais, isolado de tudo e de todos - Veja e a corporação Globo vêm atacando, veementemente, as comunidades quilombolas. Para estas comunidades, que apenas com o artigo 68 da constituição de 1988 tiveram reconhecida a sua existência e seu direito à terra, este é mais um capítulo em sua longa história de resistência. O período pós-abolição selou significativamente a história quilombola. Marcados pela invisibilidade social, enquanto remanescente de quilombolas, no meio rural tiveram as suas terras griladas, ou ocupadas por órgãos governamentais ? é o caso do Quilombo do Bracuí, em Angra dos Reis, e do Quilombo da Marambaia, em Mangaratiba, respectivamente.A relação dos remanescentes quilombolas com setores do Movimento Negro, com ONG`s e com algumas esferas do Governo Federal - Universidades, o INCRA e a Fundação Palmares, entre outros - têm fortalecido e promovido vitórias substanciais na condução da luta por direitos, já obtidos na constituição. No sentido de acompanhar os avanços neste embate, comunidades quilombolas urbanas saíram de seu silêncio. Na cidade do Rio de Janeiro, duas comunidades lutam por seu reconhecimento. São elas: a Comunidade do Sacopan e a da Pedra do Sal. O Rio que, nos tempos coloniais teve sua geografia assinalada por expressivo número de escravos e seus descendentes, configurou-se como um campo negro vívido e culturalmente intenso.Maria Cecília Velasco, em sua tese de Doutorado, ao estudar as relações dos homens que trabalhavam no porto do Rio de Janeiro - trabalho que, durante o regime escravista, era feito por trabalhadores negros (entre eles, os escravos-de-ganho). Esse grupo que continuou hegemônico no setor portuário, na virada do século XIX para o XX, mesmo com a chegada de imigrantes europeus pouco qualificados que passaram a disputar os postos de trabalho existentes - utiliza o conceito campo negro. O mesmo foi formulado por Flávio dos Santos Gomes em sua pesquisa sobre os quilombos existentes, no século XIX, na região da Baía da Guanabara. Flávio demonstrou que os contatos culturais e comerciais, entre outros, desses quilombos com as populações locais foi fundamental para pudessem circular pelas brechas existentes no sistema escravista.Ao transpor essa perspectiva para o ambiente urbano, Cecília conseguiu deslindar a lógica que tornou possível o controle dos negros no trabalho do porto. A hegemonia construída por eles não se deu apenas no nível do mercado de trabalho. Com sua cultura influenciaram indelevelmente a própria identidade carioca. Foi nos bairros habitados por esses trabalhadores que o samba nasceu, tomou formas, e invadiu os salões das casas nobres cariocas. Guardiã dessa memória, a ARQPSAL - Associação dos Remanescentes de Quilombolas da Pedra do Sal vêm resistindo para que esta página não seja mais uma página apagada da história do negro e de suas criações no Brasil. Irmanados em suas memórias e longo processo de resistência, os quilombos de todo país passaram a construir estratégias políticas similares na luta por seus direitos. À sociedade brasileira cabe legitimar essa história.

É o que bom senso nos recomenda. Saudações Quilombolas!

(*) Edimilson Santos é historiador, faz parte da equipe do LABHOI (Laboratório de História Oral e Imagem) e é um dos responsáveis pelo laudo técnico de reconhecimento da ARQPEDRA - Associação Remanescente de Quilombos da Pedra do Sal - no Estado do Rio de Janeiro.

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