Aos pés de Xangô
De acordo com o velho e bom jeito de fazer africano, é recomendável iniciar qualquer coisa reverenciando a ancestralidade, que, no caso particular da comunidade negra, tem sido muito bem lembrada, respeitada e cuidada, graças, sobretudo, ao povo de candomblé.
Por isso, não existe uma melhor forma de saudar o 20 de Novembro - inscrito pelo movimento negro brasileiro como Dia Nacional da Consciência Negra - do que retomando a frase, célebre já entre nós, da venerável iyá fundadora do Ilê Axé Opô Afonjá, a sábia Mãe Aninha Obi Biyi: "De anel no dedo aos pés de Xangô".
É muito bom poder presenciar e partilhar 311 anos depois de Zumbi dos Palmares, da disposição de pessoas negras - jovens ou nem tanto - em dirigir seus interesses e objetivos intelectuais e acadêmicos à reconstituição de nossa história; à investigação de dados sociológicos sobre as condições de vida ou sobrevivência do nosso povo; à proposição de novas formas de educar ou mesmo de edificar casas; à escritura ou reescritura etnográfica e o registro documental de nossas formas de relação com o sagrado e as artes.
Tudo isso, levando em conta o que a África e a diáspora construíram e garantiram como conhecimento e saber civilizatórios. Saber civilizatório africano que contribuiu para formar as bases da civilização universal.
É claro que muito já foi escrito sobre nós, mas é, sem dúvida, um "detalhe relevante" (como diz o poeta Limeira), quando esta produção intelectual salta das mentes e das mãos dos atores centrais das páginas da vida real do povo negro brasileiro.
Vida real que acumula déficits em relação à dignidade, reconhecimento e participação no poder, mas que, no entanto, transborda em páginas de luta, resistência, sabedoria, coragem, capacidade criativa, e, porque não, alegria e beleza.
São centenas de dissertações, teses, artigos, jornais, panfletos, ensaios, poemas, peças de teatro, romances, documentários, histórias em quadrinhos, charges, encontros, seminários, palestras, núcleos de estudos universitários, enfim, um patrimônio conquistado "à unha" pela organização do povo negro, haja vista, só para dar um exemplo, a verdadeira guerra que temos travado, contemporaneamente, para garantir os, ainda mínimos, percentuais de acesso às universidades brasileiras.
Esta disposição guerreira do povo negro para lutar pela vida e pela dignidade é a maior herança que recebemos de Xangô, o orixá que nunca morreu, e jamais morrerá, assim como ancestrais ilustres, como Mãe Aninha e Zumbi, que nos animam a continuar.
Lindinalva Barbosa (*)
* Lindinalva Barbosa é Omorixá Oyá do Terreiro do Cobre, mestranda em Estudos de Linguagem da Universidade Estadual da Bahia (Uneb) e representante regional da Fundação Cultural Palmares em Salvador, Bahia.
Por isso, não existe uma melhor forma de saudar o 20 de Novembro - inscrito pelo movimento negro brasileiro como Dia Nacional da Consciência Negra - do que retomando a frase, célebre já entre nós, da venerável iyá fundadora do Ilê Axé Opô Afonjá, a sábia Mãe Aninha Obi Biyi: "De anel no dedo aos pés de Xangô".
É muito bom poder presenciar e partilhar 311 anos depois de Zumbi dos Palmares, da disposição de pessoas negras - jovens ou nem tanto - em dirigir seus interesses e objetivos intelectuais e acadêmicos à reconstituição de nossa história; à investigação de dados sociológicos sobre as condições de vida ou sobrevivência do nosso povo; à proposição de novas formas de educar ou mesmo de edificar casas; à escritura ou reescritura etnográfica e o registro documental de nossas formas de relação com o sagrado e as artes.
Tudo isso, levando em conta o que a África e a diáspora construíram e garantiram como conhecimento e saber civilizatórios. Saber civilizatório africano que contribuiu para formar as bases da civilização universal.
É claro que muito já foi escrito sobre nós, mas é, sem dúvida, um "detalhe relevante" (como diz o poeta Limeira), quando esta produção intelectual salta das mentes e das mãos dos atores centrais das páginas da vida real do povo negro brasileiro.
Vida real que acumula déficits em relação à dignidade, reconhecimento e participação no poder, mas que, no entanto, transborda em páginas de luta, resistência, sabedoria, coragem, capacidade criativa, e, porque não, alegria e beleza.
São centenas de dissertações, teses, artigos, jornais, panfletos, ensaios, poemas, peças de teatro, romances, documentários, histórias em quadrinhos, charges, encontros, seminários, palestras, núcleos de estudos universitários, enfim, um patrimônio conquistado "à unha" pela organização do povo negro, haja vista, só para dar um exemplo, a verdadeira guerra que temos travado, contemporaneamente, para garantir os, ainda mínimos, percentuais de acesso às universidades brasileiras.
Esta disposição guerreira do povo negro para lutar pela vida e pela dignidade é a maior herança que recebemos de Xangô, o orixá que nunca morreu, e jamais morrerá, assim como ancestrais ilustres, como Mãe Aninha e Zumbi, que nos animam a continuar.
Lindinalva Barbosa (*)
* Lindinalva Barbosa é Omorixá Oyá do Terreiro do Cobre, mestranda em Estudos de Linguagem da Universidade Estadual da Bahia (Uneb) e representante regional da Fundação Cultural Palmares em Salvador, Bahia.
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